
Além de seus conhecimentos de medicina, também era exímio conhecedor de música, era caçador, conhecia as plantas medicinais e cirurgia. Era amigo dos heróis, além de educador de muitos deles. Pode-se dizer que Quíron foi o mais antigo professor na mitologia e de mitologia grega.
Certa vez foi atingido acidentalmente por uma flecha envenenada, em uma batalha do herói Héracles. A flecha produzia feridas incuráveis, sofrendo Quíron de dores horríveis e nem mesmo seus conhecimentos de medicina conseguiam curar as suas próprias feridas. As dores e seu desespero eram tamanhos que o Quíron renunciou a sua imortalidade, conseguindo, então, morrer, escapando do sofrimento terrível.”
Este é o mito do curador ferido, aquele que cura as feridas dos outros, mas, no entanto, não consegue curar as próprias feridas. O Quíron é o arquétipo do psicólogo, conseguindo curar as feridas dos outros, sem conseguir curar as próprias dores psíquicas. Assim somos nós, psicólogos ao olhar os outros, ajudando a tantos quantos nos procuram e nem sempre conseguindo olhar e resolver nossas próprias dores.
Hoje fui assistir ao filme "O Palhaço", do Selton Mello, aliás fantástico, me fez lembrar do Quíron. Ele é uma espécie de Quíron, fazendo rir, mas esperando quem o faça rir, quem cure as suas dores e tristezas. De certa forma, "O Palhaço", pode ser interpretado como o papel do psicólogo, que faz "rir", mas que nem sempre consegue rir, necessitando de outros que o façam rir, que o façam feliz.
As relações, intensas e tensas, mostradas no filme, mostram também a necessidade de cada um de nós em buscar uma identidade própria. "Gato gosta de leite, rato gosta de queijo, e eu sou Palhaço" (frase do filme, aliás a frase do filme), com esta frase o protagonista mostra a sua verdadeira busca de si mesmo. Foi vivenciando todo o confronto com seu lado sombra, triste e sem graça, embora cômico, que o Palhaço pode engendrar uma espécie de individuação. O mergulho se passa em cada momento poético, porém triste, do filme.
A paisagem árida, retrato de seu interior, as cores pasteurizadas relatando o seu inconsciente, as idas sem vindas, relatam a viagem só de ida ao centro de seu eu. O resgate? Sai individuado, descobrindo o Palhaço, que era, sem nunca ter se dado conta de que era.
Agora vá lá ver o filme e prestigiar mais esta obra prima do cinema brasileiro com a impecável atuação do Selton e do brilhante Paulo José.